Os moldes do Jornalismo da atualidade parecem não corresponder às expectativas dos jovens. A instantaneidade das notícias e a densidade dos temas são polos opostos que culminam na falta de interesse do público jovem em se manter informado, por iniciativa própria.
Os jovens consomem conteúdo noticioso utilizando as mesmas fontes, as mesmas plataformas e estão dispostos a pagar para obter informação?
Beatriz Sousa Santos é uma jovem de 22 anos, recém-licenciada em Ciências da Comunicação, que ao longo do seu percurso académico se sentiu ligada ao jornalismo: “acho que na minha área seria estranho não ter o hábito de ler notícias”. A necessidade de estar a par do que se passa no mundo, sempre a levou a ser uma consumidora ativa de informação. Ao desbloquear o telemóvel, seleciona a pasta na qual guarda todas as aplicações dos órgãos de comunicação social, nomeando as que acompanha diariamente: o Jornal de Notícias, A Bola, O Jogo e o Público.
A necessidade de estar a par do que se passa no mundo, sempre a levou a ser uma consumidora ativa de informação. Ao desbloquear o telemóvel, seleciona a pasta na qual guarda todas as aplicações dos órgãos de comunicação social, nomeando as que acompanha diariamente: o Jornal de Notícias, A Bola, O Jogo e o Público.
Com outro ponto de vista, Rui Araújo, que, até aos 23 anos, nunca ingressou no Ensino Superior, liga os seus interesses noticiosos a atividades de lazer, nomeadamente o futebol. “Acho que alguma [informação] vem ter comigo, outra tenho de procurar”, afirma.
Para Maria José Brites – Universidade Lusófona do Porto, CICANT, “as redes sociais permitem-nos um imediatismo”. Descreve esta realidade como um género de bolha social, pois a informação veiculada é condicionada pelos próprios interesses pessoais (situação que ela refere não acontecer exclusivamente com os jovens).
O papel do jornalismo como difusor de informação
É de consenso geral que o jornalismo tem o papel de informar as pessoas, sendo um espelho da sociedade e dos acontecimentos que a acompanham. Na verdade, o público não tem um pensamento consciente sobre a atividade jornalística, sendo que a toma por garantida no seu quotidiano. Cada vez mais, a informação entra na vida das pessoas através, essencialmente, dos ecrãs do telemóvel, do computador e da televisão: “hoje em dia também se entra no Facebook, no Instagram e no Twitter, e a informação vem logo ter connosco, especialmente se seguirmos um certo jornal, aparecem logo as notícias”, diz Duarte Guimarães, estudante de Direito.
O jovem de 22 anos admite não ter um vínculo forte com o jornalismo e o seu conteúdo, mas mesmo assim acredita que continua a ser a melhor forma de estar informado sobre os assuntos que lhe despertam interesse: “no que toca a condições de acesso ao mercado de trabalho pela Ordem dos Advogados, foi através do jornalismo que fiquei a par dessas mudanças, se não ninguém falava disso”. Além de estar atento a este género de informação, devido à sua área de estudo, apenas se dedica a ler, tal como Rui, notícias sobre futebol.
As notícias relacionadas com as áreas de estudo não são só importantes para Duarte, mas também para Micaela Canêdo, recém-licenciada em Criminologia, que confirma estar mais atenta aos assuntos ligados à “criminalidade, que é algo que está sempre associado ao medo e à instabilidade na sociedade”. Na sua visão, “as pessoas gostam sempre de partilhar estes acontecimentos e de mostrar umas às outras que estes episódios ocorrem e é preciso ter noção dos mesmos”.
“Em Portugal existe uma crise muito grande do interesse das pessoas e dos jovens também, por aquilo que nós chamamos, por exemplo, as hard news.” Maria José Brites – Universidade Lusófona do Porto, CICANT
Os jovens olham para o jornalismo com a função básica de informar. No entanto, para Mariana Pinto, de 21 anos, as notícias “não são ditas de uma maneira explícita, por exemplo, os títulos são muito abrangentes e depois vê-se a notícia e [o conteúdo] não tem nada a ver”, explica a estudante de Ciências do Mar da Universidade de Aveiro. Além disso, admite não atribuir grande credibilidade às peças jornalísticas relacionadas com a sociedade.
Já Sofia Silva, auxiliar de saúde no Centro Hospitalar Conde de Ferreira, considera que o jornalismo tem um papel relativamente influenciador: “mesmo a nível da notícia, como elas são transmitidas, influencia as pessoas e o estado de espírito delas”, observa a jovem de 21 anos.
Para quem se especializou na área, como a Beatriz, o jornalismo em Portugal tem tendência a ser cada vez mais sensacionalista porque “não contam as histórias como elas são na realidade e exageram nos títulos para chamar a atenção das pessoas”. A recém-licenciada em Ciências da Comunicação refere ainda que “existe algumas estações de televisão, como a CMTV, agora também a CNN que pertence à TVI, que fazem um jornalismo demasiado sensacionalista e isso pode ser prejudicial à área”.
Os testemunhos dos jovens acabam por ir ao encontro daquilo que Maria José Brites diz: “a relação dos jovens com as notícias é múltipla, é complexa”.
A partir da presente infografia, é possível entender que os portugueses consomem notícias principalmente a partir da televisão e da Internet, estando em terceiro as redes sociais. O telemóvel é o dispositivo mais utilizado para este consumo, mas a maioria destes utilizadores também consomem informação pelo computador. O pagamento por notícias está a ser incutido cada vez mais na cultura portuguesa, sendo que 54,8% já admitiu ter aderido a um serviço de subscrição, mesmo que seja por um único artigo isolado.
Um jornalismo que se direciona para os jovens?
O jornalismo feito em Portugal parece não encher as medidas dos jovens, uma vez que sentem que esta área ainda não está preparada para corresponder às suas expetativas e interesses.
Sofia Silva confirma que o jornalismo “não assegura os interesses dos jovens”, dando o exemplo da política: Por exemplo “a maioria dos jovens nem percebe de política porque também não assiste às notícias e não se interessa pelo tema”, complementa. Para Mariana Pinto, ainda existem assuntos que despertam curiosidade ao público mais jovem: “tudo o que tenha a ver com desporto, acho que atrai mais os jovens”, porém pensa que questões sociais e do quotidiano não são tão importantes para os mesmos.
Na visão dos investigadores, como Maria José Brites, “o facto de os jovens não serem muito fonte noticiosa” poderá ser uma das razões que os leva a não dedicarem mais do seu tempo ao consumo noticioso. Acaba por acrescentar que “um aspeto que podia ser interessante era eles serem mais ouvidos e sentirem que as notícias tinham algo que se relacionava mais com eles”.
“Hoje em dia não vejo ninguém assim muito apegado a um certo tipo de jornal ou a um certo tipo de jornalismo.” – Duarte Guimarães, estudante de Direito
Nota-se um descontentamento por parte dos mais novos com uma prática jornalística que não é apelativa para eles. Como Micaela Canêdo diz “não existe um público específico” para as notícias, pois acredita que os profissionais da área tentam chegar a todas as faixas etárias.
Em Portugal, o jornal Público tem apostado em vertentes para a geração Z e millenials, com a criação do P3: uma editoria com notícias e informação direcionadas para os mais novos. Este projeto nasce com o intuito de aproximar este público, em particular, ao jornalismo. Na mesma linha de pensamento, nasce o PSuperior – oferta de assinaturas do jornal digital para os universitários – uma iniciativa que se preocupa com a oportunidade de os jovens estudantes terem um fácil acesso a todo o tipo de informação, incluindo a mais exclusiva.
A verdade é que muitos dos jovens não tem conhecimento destes serviços do jornalismo, que se tentam aproximar deles. No entanto, os que estão a par disto, como é o caso da Beatriz, optam por não usufruir destas possibilidades, alegando nunca terem sentido necessidade para tal.