A geração do século XXI vai lidar com a emergência climática na primeira fila. Os jovens devem por isso ter a noção do estado do planeta. A primeira escola onde se ganha uma consciência ambiental são os jardins de infância.
Nas férias de verão, a sexta-feira é dia de brincadeira fora de portas na “Casa das Abelhinhas”. O chão bege do infantário é trocado pela relva e as árvores deixam de ser paisagem de janela para estarem mesmo ali ao lado. O entusiasmo das crianças é visível enquanto esperam que tudo esteja pronto para saírem. Formam uma fila com as educadoras e andam 500 metros rumo ao Jardim do Passeio dos Heróis do Mar, no Parque das Nações em Lisboa.
Chegam, tiram as mochilas e sentam-se para comer o lanche da manhã. Depois de falarem entre as turmas, vão brincar, envolvidos num ambiente diferente do resto da semana. Na manhã de sexta-feira em que acompanhei a “Casa das Abelhinhas”, as crianças de três, quatro e cinco anos deste jardim de infância mostraram a sua consciência ambiental.
Um dos assuntos falados foi a poluição das praias e dos oceanos. “Os humanos, como não sabem, deitam o lixo para o oceano e os peixes morrem. Ficam fracos”, resume uma das crianças. Outra diz que quando vai à praia apanha o lixo e deita-o no caixote.
Devemos desligar a água enquanto lavamos os dentes? A resposta dada é clara: “Eu não deixo”. Acrescentam: “Assim desperdiça a água. Precisamos de beber”. Houve ainda quem resumisse o processo da reciclagem assim: “Quando os caixotes estão cheios, o carro do lixo vem. Apanha com a grua o lixo, leva para a fábrica e depois transforma em coisas novas”.
Uma breve história da educação ambiental
A educação ambiental é um dos seis temas de Cidadania de abordagem obrigatória nas escolas portuguesas. É o que está determinado na Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, em vigor desde 2017. Mas já em 1986, ano que foi publicada a Lei de Bases do Sistema Educativo, este assunto entrou nas salas de aula. Ainda antes, as preocupações ambientais já estavam na agenda mundial.
A Conferência de Estocolmo em 1972 foi um marco na história das Nações Unidas. Tratou-se do primeiro grande encontro para abordar os problemas ambientais. Ao todo, estiveram presentes mais de 110 países e daqui saíram os princípios para a conservação do meio ambiente. A declaração da conferência abordou a importância de trazer estes temas para a escola. As Conferências de Belgrado (1975), Tbilissi (1992) e Rio (1992) aprofundaram esta preocupação.
De acordo com a UNESCO e o Programa das Nações Unidas para o Ambiente, a educação ambiental é um “processo permanente e participativo de explicitação de valores, instrução sobre problemas específicos relacionados com a gestão do Ambiente, formação de conceitos e aquisição de competências que motivem o comportamento de defesa e preservação e melhoria do Ambiente”. Este conceito não está portanto virado apenas para as escolas, mas para toda a sociedade.
Alguns dos temas da Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania têm um documento orientador. É o caso da educação ambiental: o Referencial da Educação Ambiental para a Sustentabilidade explica os temas do programa e propõe atividades a realizar em todos os níveis de ensino. Desde os alunos mais velhos do 12ºano ao mais novos do ensino pré-escolar.
Uma “preocupação moderada” para os mais pequenos
Os corredores da “Casa das Abelhinhas”, um jardim de infância que fica em Lisboa, são montras do trabalho das crianças feito ao longo do ano. Alguns deles estão relacionados com o tema do projeto educativo da escola. Desde 2019 – e até 2022 – que o infantário dedica muitas atividades à Natureza, aos problemas ambientais e ao desenvolvimento sustentável.
A diretora técnica do jardim de infância, Anaísa Colaço, acredita que “há mais de 50 anos, quando começaram as cimeiras mundiais sobre o ambiente, as pessoas simplesmente ignoravam ou achavam que era algo que nunca chegaria”. Perante a iminência das alterações climáticas, na “Casa das Abelhinhas” tentam passar uma “preocupação moderada”. As educadoras sabem que lidam com crianças e que devem simplificar o discurso, mas o objetivo é que percebam a importância de “fazer algo para mudar”.
Pequenos hábitos tornam-se grandes lições
As efemérides ambientais são momentos para focar a atenção no ambiente: não apenas a das crianças, como também a das famílias. A comunicação social assinala datas como o Dia Mundial da Terra ou dos Oceanos nas notícias. A hora do jantar, com a família à mesa, pode ser um momento de debate. A televisão fala sobre estes assuntos e a criança “mostra a sua reflexão crítica porque foi um assunto abordado na escola”, defende Anaísa.
Para além destas comemorações, o infantário procura introduzir uma consciência ambiental diária. Todas as semanas, as salas rodam entre si a gestão da horta pedagógica. As crianças regam e colhem os legumes, que entregam depois ao cozinheiro da escola e prepara o almoço para todos. A comida feita a mais é entregue à Associação Refood. São as próprias crianças que colocam essa comida que sobra em caixas, que seguem depois para famílias carenciadas. Estes hábitos sustentáveis até nas brincadeiras estão presentes. As educadoras usam materiais recicláveis em atividades e para criar brinquedos. As turmas percebem assim que é possível dar uma nova vida ao que ia para o lixo.
“Estamos a formar futuros adultos. Vão ser os agentes multiplicadores da consciência que queremos passar relativamente ao ambiente”, afirma Anaísa Colaço. É este o sentido de missão presente em quem trabalha com crianças e que devem ser exemplos para elas. Serão o futuro do planeta: os jovens de hoje aprendem a lidar agora com o mundo que os rodeia para, quando forem os adultos de amanhã, pensarem em como podem melhorá-lo.